“É possível e vantajoso conciliar a ecologia com a economia”

A Ecoinside, tecnológica da área das energias renováveis, eficiência energética e mobilidade elétrica, terminou recentemente um projeto de instalação de painéis fotovoltaicos na Companhia Nacional de Comércio de Bacalhau. Sabendo-se que, a nível global, o sector agroalimentar é responsável por 14% das emissões de gases com efeito de estufa, António Cunha Pereira, CEO da Ecoinside, aborda as oportunidades e desafios que o sector enfrenta, face às alterações climáticas e urgente e imperativa descarbonização da economia. A Ecoinside pretende auxiliar as empresas portuguesas a cumprirem com as metas que estabelecem que, já no início da próxima década, Portugal deverá contar com 80% da sua energia a ser fornecida a partir de fontes renováveis e com uma redução de 50% das emissões de carbono.Grande Consumo – O que é a Ecoinside e a que se dedica?

António Cunha Pereira – A Ecoinside é uma tecnológica de energias renováveis e soluções sustentáveis, que nasceu, em 2006, na Universidade do Porto, e que tem como prioridade promover o desenvolvimento sustentável. A nossa ideia base passou, precisamente, por inserir no léxico português a palavra ecoeficiência, procurando refletir na prática a ideia de que é possível e vantajoso conciliar a ecologia com a economia. Somos especializados em energias limpas, sustentabilidade e mobilidade elétrica e contamos já com um portfólio de mais de 200 clientes, entre indústrias, autarquias e empresas de serviços. Desde o início que quisemos contribuir ativamente para o desenvolvimento sustentável e para a criação de valor para os colaboradores, clientes, fornecedores e para o ambiente em que temos impacto. Por esse motivo, a nossa meta é apoiar os nossos parceiros com planos e estratégias de crescimento que estejam de acordo com os objetivos para o desenvolvimento sustentável, nomeadamente, no apoio à tomada de decisões que façam o seu projeto ambientalmente responsável, ajudando na criação de novos postos de trabalho num ambiente mais limpo e com melhor qualidade de vida. Atuamos em cinco grandes áreas – energias renováveis, eficiência energética e hídrica, gestão de energia, sustentabilidade e mobilidade elétrica -, e distinguimo-nos por olharmos para a área de energia numa perspetiva de 360 graus, apoiando as empresas nos seus esforços de redução de custos e da sua pegada ecológica.

GC – Que balanço pode fazer do tempo que leva em atividade?

ACP – O balanço que fazemos destes 15 anos de atividade é bastante positivo. Podemos destacar o ano de 2019, que se assinala como o primeiro em que a Ecoinside passou a barreira dos dois milhões de euros de volume de negócios. Já em 2020, a chegada da pandemia trouxe alguma incerteza, no entanto, e felizmente, com uma grande articulação com os nossos clientes e parceiros, conseguimos que projetos que já tínhamos em carteira fossem iniciados e que obras fossem concluídas e nenhum projeto foi suspenso decorrente da situação complexa criada pela Covid-19.Ao mesmo tempo, foi durante este período conturbado que recebemos a notícia de que a Ecoinside tinha sido eleita como uma das 15 empresas mais felizes para trabalhar do ano, facto que veio dar uma motivação adicional à organização para continuar a ter as melhores condições de trabalho, tanto no escritório como em regime de teletrabalho. Já 2021 adivinha-se como um ano bastante positivo para o contínuo crescimento da organização, com a perspetiva de aumentarmos em quatro vezes o nosso volume de negócios e de crescer a nossa equipa, por forma a ter capacidade de manter o nosso serviço de proximidade com todos os clientes. Parece-nos que o segredo passa por atuarmos no mercado de uma forma transversal, acompanhando ao máximo as tendências mais atuais do ponto de vista tecnológico e de resultados de poupança para as empresas. Hoje, temos noção que as energias renováveis, com o solar fotovoltaico em particular, são o grande tema do momento, tal como foi no passado a iluminação LED, mas a Ecoinside procura estar atenta às próximas evoluções. A nossa faturação acompanha as tendências e estamos já a pensar nos próximos temas do ponto de vista energético.

GC – Quais as medidas que podem ser implementadas e com maior impacto/resultado na diminuição da emissão dos gases com efeito de estufa? Que soluções tem a empresa disponíveis para o retalho e o agroalimentar?

ACP – O agroalimentar é, em geral, um sector com consumos energéticos bastante significativos, que está fortemente pressionado pelas suas cadeias logísticas, devido à perecividade dos produtos e aos prazos muito curtos para entregas. Na sua grande maioria, tem cadeias de frio que implicam consumos energéticos constantes. As necessidades energéticas são, por isso, naturalmente, altas e os custos aumentam exponencialmente, por esse motivo. Ao mesmo tempo, é um sector com uma grande preocupação ambiental, tendo constantemente de se reinventar. A ineficiência energética é grande na generalidade das empresas de retalho e agroalimentar, pelo que o potencial de melhoria é elevado. É possível tornar o consumo mais eficiente, implementando algumas medidas simples e, deste modo, baixar significativamente o custo desta energia. As indústrias do sector agroalimentar têm uma grande tendência para o desperdício de energia, principalmente térmica e elétrica, que são utilizadas nas diversas operações de transformação, como cozeduras e refrigeração. A forte dependência da refrigeração e da iluminação, por exemplo, que são dois usos finais com relevância, é um problema sério nestas indústrias. Há, no entanto, medidas que podem ser rapidamente implementadas, como, por exemplo, uma melhor gestão da energia. As auditorias energéticas, para uma maior perceção da realidade, são úteis, já que possibilitam um diagnóstico mais adequado e verdadeiro de cada situação. O estudo de medidas de eficiência energética, nestes casos, ganha uma dimensão maior, uma vez que temos a oportunidade de identificar medidas de melhoria que sirvam de suporte e possam ser replicadas noutras empresas da mesma área – a nossa ideia é olhar para o sector de forma transversal e ir construindo com as associações, a título de exemplo, uma base de dados com indicadores energéticos que possa ser uma mais-valia para que as empresas se tornem mais competitivas nas suas estruturas de custos. De facto, sabemos que as empresas, muitas vezes, olham para o custo energético como algo inevitável, mas não tem de ser assim, a energia pode ser alvo de racionalização. Claro está que a produção de energia a partir de fontes renováveis é e tem se ser também um caminho a seguir, a par da promoção da eficiência energética. Esse será um primeiro passo que garantirá poupanças diretas na fatura da eletricidade.

GC – Que incentivos e tecnologias existem hoje ao dispor das empresas do sector para diminuir a sua pegada ecológica?

ACP – Ao nível dos incentivos, podemos destacar o fundo de investimento de capitais próprios, que criámos em 2020, e que, no valor de 15 milhões de euros, é destinado a apoiar as empresas portuguesas na transição energética e na redução de consumo de energia elétrica. O fundo permite que as empresas alberguem, por exemplo, centrais fotovoltaicas que produzem eletricidade a partir de energia solar, nas suas instalações, para aí ser consumida. Conseguem-se, assim, poupanças imediatas interessantes, adaptadas às necessidades energéticas de cada indústria. Este é um excelente exemplo de um investimento criado pela Ecoinside que pretende auxiliar as empresas portuguesas a cumprirem com as metas do Plano Nacional de Energia e Clima (PNEC) 2030, que estabelecem que, já no início da próxima década, Portugal deve contar com 80% da sua energia a ser fornecida a partir de fontes renováveis e com uma redução de 50% das emissões de carbono. No entanto, existem outros apoios governamentais, como é o caso das últimas verbas do Portugal 2020, e perspetiva-se que o Portugal 2030 traga também bastantes apoios para as áreas de atuação da Ecoinside. A grande questão é quando chegarão esses apoios e se compensa às empresas esperarem por esse apoio ou avançarem já com a implementação das soluções tecnológicas que permitam reduzir os seus custos. Já no que diz respeito às tecnologias, podemos destacar a remodelação do edificado existente. Só podemos combater a pobreza energética se dotarmos os edifícios portugueses de melhor isolamento térmico, tanto ao nível das paredes como dos tetos, ou optando por colocar janelas mais eficientes energeticamente. Também a instalação de unidades para autoconsumo (UPACs), em regime de Comunidades de Energia Renovável (CER), poderá ter um grande impacto na redução dos custos da energia e um significativo impacto positivo ao nível ambiental. Podemos também destacar as tecnologias associadas à mobilidade elétrica que permitem às empresas reduzirem substancialmente as suas emissões de CO2, ao mesmo tempo que reduzem os custos associados ao transporte de pessoas e bens.

GC – Como é que a Ecoinside pode, e tem vindo, a descarbonizar a economia? Quais foram os principais projetos desenvolvidos até à data?

ACP – Ao longo dos nossos 15 anos de história, são já diversos os projetos que temos realizado, sempre com o objetivo de descarbonizar a economia e promover a transição energética. No caso particular do sector agroalimentar, somamos já 11 projetos concluídos, dos quais o mais recente exemplo é o da Companhia Nacional de Comércio de Bacalhau (CNCB).Para que os leitores possam ter uma ideia, apenas com os 11 projetos que já concluímos neste que é um dos sectores nos quais é fundamental agir para garantirmos um futuro mais sustentável, conseguimos produzir anualmente energia suficiente para alimentar o consumo de 738 famílias, o que corresponde a uma produção de mais de 3.600 MWh por ano, e que equivale à plantação de quase 25 mil árvores (considerando que serão quase 1.700 as toneladas equivalentes de petróleo de dióxido de carbono cuja emissão para a atmosfera é evitada).

GC – Qual o peso do sector agroalimentar em termos de emissão de gases com efeito de estufa? E do retalho?

ACP – O sector agroalimentar é muito abrangente e inclui atividades que vão desde a agricultura até ao armazenamento ou transformação. Por este motivo, é difícil quantificar ao detalhe qual a responsabilidade de cada área ao nível da emissão de gases com efeito de estufa. Sabemos, no entanto, e a título de exemplo, que a agricultura é responsável por 8,72% das emissões e que os processos industriais e uso de produtos totalizam 7,82% do lançamento de gases com efeito de estufa (aqui se inclui a indústria de bebidas e alimentos), de acordo com dados da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre as alterações climáticas.

GC – Tem-se registado uma mudança de paradigma no que a esta temática diz respeito? Irá assistir-se a uma nova oferta de produtos agroalimentares, fruto de uma nova perspetiva e compromisso do consumidor final com a temática da sustentabilidade?

ACP – Sabemos que há uma preocupação crescente no que toca aos temas da sustentabilidade e da importância da gestão das emissões de carbono. As empresas contam com soluções tecnológicas cada vez mais evoluídas para avaliar e gerir emissões de CO2 e de outros gases de efeito de estufa em toda a cadeia de valor, desde a obtenção de materiais até a fabricação e distribuição final. Isto exigirá, portanto, que fornecedores, operações e logística determinem e divulguem a suas emissões relativas. As empresas podem usar esta informação para obter melhores perceções e tirar conclusões, que lhes permitam consolidar, analisar e gerir a pegada de carbono dos seus produtos e serviços individuais com maior eficácia. Fazendo essa gestão, conseguem criar novos produtos ou reinventar os produtos atuais. É aqui, exatamente, que se vislumbram algumas das mais-valias da Ecoinside enquanto aglutinador de tecnologia e de consultoria ativa no cálculo da pegada carbónica das empresas. Vemos como sendo cada vez mais fundamental que as empresas deste e de todos os sectores obtenham relatórios de informação não financeira, ou relatórios de sustentabilidade, para que possam ter um retrato cada vez mais rigoroso da sua realidade e impacto do ponto de vista ambiental. As tendências de evolução do mundo do retalho e sector agroalimentar passarão, certamente, muito por ouvir cada vez mais os consumidores e preparar as suas cadeias logísticas para uma nova realidade que vá de encontro às expectativas destes mesmos clientes.

GC – O que seria um bom exercício de 2021 para a Ecoinside?

ACP – Alcançarmos os objetivos propostos de aumentarmos em quatro vezes o nosso volume de negócios e continuar a contratar para que possamos manter a proximidade com os nossos clientes, sem nunca esquecer da importância de nos mantermos atualizados e em permanente investigação no que à sustentabilidade diz respeito.

 Grande Consumo Online – 09 DE NOVEMBRO 2021 

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