Energia: o peso das renováveis e a responsabilidade coletiva

Dinheiro Vivo, 29/05/2022 –  A energia, em particular os preços da mesma, está no centro do debate desde 2020 quando despontou a pandemia, adensou-se com a situação de conflito na Europa e é hoje parte de qualquer conversa mais ou menos informada. A agenda governativa, tanto nacional como europeia, passou a estar pautada por temas como a eficiência energética ou a transição energética e tem como elemento central o grande objetivo de alcançar a descarbonização em 2030. E, na verdade, estamos todos a correr por esse objetivo, devendo servir, o Dia Nacional da Energia, que se assinala a 29 de maio, para um importante momento de reflexão. Afinal, por entre tantas notícias negativas, pode haver aqui afinal luz ao fundo do túnel no que se refere à competitividade da economia nacional.

 

A definição e operacionalização de diversos instrumentos como o Roteiro para a Neutralidade Carbónica 2050, o Plano Nacional de Energia e Clima (PNEC 2030), e, mais recentemente, a Estratégia de Longo Prazo para a Renovação do Edificado público, são a prova da importância do debate em torno da energia e de como a consumimos, gerimos e produzimos. A neutralidade carbónica passa naturalmente por aqui, pela definição de um plano claro para aquela que deve ser a composição do mix energético nacional.

A importância da correta utilização da energia está cada vez mais evidente na comunidade, que demonstra preocupação tanto com o consumo, como com a produção da energia. É evidente que a instabilidade dos mercados, a escalada da inflação e a disrupção das cadeias logísticas foram o cenário ideal para esta atenção ao tema. Talvez por estas razões, é hoje um imperativo nacional atingir a neutralidade carbónica em 2050.

Já em 21 de maio de 2020 foi aprovado em Conselho de Ministros o PNEC 2030, que estabelece um conjunto de metas em matéria de energia e clima para o horizonte 2021-2030, nomeadamente a redução das emissões de gases com efeito de estufa entre 45% e 55% face a 2005, a redução do consumo de energia primária em 35%, o aumento do peso das energias renováveis no consumo final bruto de energia para 47%, devendo o peso das renováveis no setor dos transportes atingir 20%.

No PNEC 2030, a eficiência energética continua a ser uma área prioritária, e conjuntamente com o reforço da aposta nas energias renováveis contribuirá para redução da dependência energética do país para 65% em 2030 e para valores inferiores a 20% em 2050. Para se atingirem tais metas, no decorrer de 2020 foram ainda aprovados o Plano Nacional do Hidrogénio e a Estratégia Portugal 2030 baseado no documento “Visão Estratégica para o Plano de Recuperação Económica de Portugal 2020 – 2030” onde se destaca o eixo estratégico “A transição Energética e Eletrificação da Economia”, que aborda a transição climática e a sustentabilidade dos recursos, dando ênfase à descarbonização da indústria e à promoção da mobilidade sustentável e eficiência energética.

 

Naturalmente, há aqui um conjunto de oportunidades que devemos ter em conta, quer para o desenvolvimento do sistema económico nacional, quer para a criação de empregos mais qualificados.

O sinal positivo é que o próprio setor elétrico nacional está a mudar e a modernizar-se, apostando cada vez mais na digitalização, descentralização da produção e na descarbonização, permitindo que a energia que consumimos em nossas casas e empresas seja cada vez mais renovável e sustentável. É certo que a discussão está, e continuará a estar, muito focada no preço. No entanto, há questões fundamentais que temos de analisar com detalhe. Por um lado, a composição do mix energético nacional. Por outro, a dependência que a nossa economia tem da produção energética externa. Se há um impacto imediato do conflito russo-ucraniano, poderá ser esta necessária aceleração do trabalho de reflexão que a Europa teimava em adiar.

A dependência energética nacional, segundo dados da Edição de 2021 da publicação do Observatório da Energia, tem vindo a cair entre 2009 e 2019, de 81,2% para 74,2%. A meta é alcançar os 65% até 2030, mas ainda assim Portugal continua a estar na 8ª posição a nível europeu. No que se refere ao gás natural proveniente da Rússia, Portugal não está de facto tão exposto como outros países, no entanto a importação de gás natural daquele país andará em torno dos 10%.É importante destacar que, segundo dados revelados pela DGEG, 49,5% das importações de gás chegam-nos da Nigéria. Temos ainda as participações do estado chinês no sistema elétrico nacional: 20,22% na EDP e 25% na REN.

 

A produção de energia a partir de fontes renováveis é, por isso, um ponto fundamental na estratégia nacional para a energia, bem como a diversificação do nosso mix energético. As energias renováveis têm aumentado significativamente, tendo por exemplo representado cerca de 58% do consumo de eletricidade em 2021 – o que, comparativamente com o ano de 2020, é um progresso interessante, onde as renováveis representavam 34% do consumo. Entre janeiro e abril, a nível europeu, Portugal posiciona-se na quarta posição entre os países com maior incorporação renovável na geração de eletricidade, ficando atrás apenas da Noruega, Dinamarca e Áustria. Pode, portanto, dizer-se que o paradigma nacional está a mudar.

Apesar disso, o preço da eletricidade continua a ser uma preocupação natural, agravada pelo contexto de incerteza do conflito entre Rússia e Ucrânia. Este sistema já é frágil, mas sem energias renováveis poderia traçar-se ainda mais negro. O impacto da subida de preços da energia foi de certa forma mitigado pelo aumento das energias renováveis no nosso mix energético. No estudo recente da APREN, de março deste ano, verificou-se inclusive que em 2021, caso não existisse produção de eletricidade a partir de fontes renováveis o preço do MWh da eletricidade teria sido, em média, superior em 88€ ao verificado.

A verdade é que, pelo preço ou pelo impacto no ambiente, sentimos todos a necessidade de reduzir a pegada carbónica. Desde o cidadão comum, até à indústria que se vê confrontada com a necessidade de conciliar as suas atividades core com a implementação de medidas cimentadas em boas práticas ambientais.

 

Ao aumentarmos a produção de energia a partir de fontes renováveis estamos a ajudar a reduzir o custo energético, pelo que poderá ser esta uma das respostas mais imediatas à preocupação do cidadão comum e da indústria. A meta de descarbonização da economia nacional até 2030 deve estar presente nos pequenos hábitos do nosso quotidiano e na economia e deverá continuar a ser um desígnio nacional e europeu. A mobilidade elétrica, a gestão inteligente dos consumos energéticos ou mesmo a implementação de programas de sustentabilidade na indústria são possíveis caminhos para reduzir de forma mais efetiva os problemas detetados. Um esforço por todos e da responsabilidade de todos!

Ricardo Marques, Diretor de Marketing Ecoinside

Fonte: DINHEIRO VIVO

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